segunda-feira, 18 de abril de 2011

Mario Biagini


Texto traduzido da fala de Mario Biagini (ator de Grotowski) antes apresentação de um espetáculo, retirada do vídeo que Thomas Richards apresentou sobre uma peça que montou com o workcenter mostrado durante a sua palestra que ocorreu no dia 16 de abril de 2011, as 19:30, no Teatro do Oi Futuro em Belo Horizonte:

Action in Aya Irini
“Bom, finalmente estamos aqui! Boa noite! O que vocês vão ver é algo que tem uma natureza peculiar. Antes vou contar alguns pequenos detalhes do que vocês vão ver. Este é um trabalho que nós chamamos de Action (Ação). Para mim não é simples explicar o que seria Action. É mais fácil explicar o que Action não é.
Primeiro, é bom que vocês saibam que Action não é um espetáculo, no sentido de que é algo que não é feito para ser mostrado. É allgo que pode ser visto, sim pode ser visto, mas não é feito somente para isso. Pode haver observadores externos, como vocês que hoje estão aqui, mas também pode não haver nenhum. Outra coisa que Action não é: improvisação. Não é improvisado. A sua estrutura é muito, muito precisa. E pode ser realizada novamente. Não é como um tiro de arma de fogo.
Bem, não é espetáculo, não é improvisação. Então o que é? Vocês vão ver por si próprios. Talvez quando alguém, assim como vocês, veja Action do lado de fora, possa pensar que é uma nova forma de arte, um novo fenômeno artístico. Um fenômeno artístico que aceite, até mesmo abrace o olhar de um observador externo, mas sem depender desse olhar. Quero dizer que o seu sentido não depende do olhar de um observador externo.
O observador externo pode estar lá, mas também pode não haver observador. Dada à natureza deste trabalho, nós temos um simples conselho, não olhem simplesmente para a história que vocês vão ver. Podemos falar através das analogias e podemos dizer que a Action tem mais as características da poesia do que da prosa narrativa mas é claro que esta é apenas uma analogia. Fazem parte da Action pequenos fragmentos de textos.
E estes textos são em inglês e as traduções que nós fizemos foi a partir de uma antiga língua Coptic. E nós a fizemos de uma forma muito, muito simples. Nós apenas traduzimos brutalmente o texto palavra por palavra. Nós nem sequer tentamos fazer uma boa frase em bom inglês, e claro que fizemos isso intencionalmente. Foi a nossa forma de tentar, tanto quanto o possível, traduzir apenas o que o texto estava dizendo, sem dar uma interpretação ao traduzi-lo.
Então, em Istambul, foi isso que nós fizemos, com a ajuda de Chidam, uma tradução turca. E agora eu gostaria de dar-lhes o texto para ler. Vou dar a versão em inglês e a versão em turco. O texto é muito curto, ele cabe em uma página. E os fragmentos aparecem na página na mesma ordem que aparecem na Action. Peço que leiam e os devolvam a mim.”

Obs: na foto está primeiro, Mario e depois Thomas.

Minhas anotações sobre a palestra de Thomas Richards


Essas são as minhas anotações sobre a palestra, é claro que podem haver algum entendimento diferenciado sobre os assuntos e etc:


Anotações da palestra de Thomas Richards:

* Grotowski uma vez disse a Thomas: “Vou lhe contar um grande segredo: quando cantar, não escute a sua própria voz, porque escutá-la vai lhe trazer insegurança, e automaticamente, a laringe vai reagir dificultando a saída da voz. Então, quando cantar escute o espaço e todo o som que ressoa nele enquanto canta.
*Quando quase sofremos um acidente de carro, antes de pensarmos o que fazer, a primeira coisa que sentimos é o abdômen. Nesse instante estamos ativando a nossa “vida vital”.
*Contraímos nosso abdômen por vários motivos, e um deles é o medo. Só que para cantar, é interessante que não estejamos tensionados e nem relaxados, devemos encontrar um equilíbrio entre a tensão e o relaxamento, de forma que quando cantamos, todo o meu corpo ressoe o canto e vibre com ele.
*O ator universitário pode se prender a conceitos e não sentir em seu corpo o que está antes e além desses conceitos: a transformação.
*O guru quando vai ensinar os mantras a seu aprendiz, ele não ensina o significado das palavras ditas, mas sim, como cantar. E então, após muita repetição, o significado vem sendo compreendido, percebido ao aprendiz de acordo com sua necessidade.
*O jeito de escutar música no ocidente é através dos significados das letras. O que para Thomas, é morto.
*Para mantermos uma sincronia nos movimentos, temos que ver e escutar o que está fora de você. Tudo faz parte dessa precisão (Motion).
*Quando criamos uma cena, devemos perceber o que está vivo ali, e o que está morto. É difícil, mas é o ideal. Quantas vezes percebemos atores fazendo coisas sem sentido: mortas. E a memória pode ser ago que ajude a ser vivo. “No momento em que estava vivo, o que eu sentia? O que eu queria ali?” E então, uma parte especial de mim lembra, é como se eu estivesse dentro da memória. Por exemplo, a primeira vez que cantei aquela melodia funcionou, e eu estava olhando fixamente para uma pessoa, e por quê? Essa pessoa me lembrava minha irmã quando tinha 13 anos. Então, todas as vezes que eu voltar a cantar essa melodia, vou pensar em minha irmã e encontrá-la em quem eu ver. É também, quando eu levanto minhas mãos e me lembro de Grotowski fazendo essa ação. Minha ação me remete a outras coisas. E é essa a diferença entre o bom ator e o ator ruim. O bom ator não entrega tudo a platéia, ele tem suas ações e uma parte que ninguém vê, que são essas memórias que vão além. Já o ator ruim, faz suas ações de forma chapada, porque não têm pensamentos que vão além das ações.
*Uma pessoa perguntou a Thomas o que o fez sentir uma transformação em seu modo de fazer o teatro ao longo da vida, o que o fez sentir profissional. E Thomas respondeu: “Se você trabalha muito em uma coisa e percebe que você não tem importância para essa coisa, mas o que tem importância é o conhecimento. Quando não há resistência entre você e o que você faz, o que não quer dizer que não haja crises, muito pelo contrário, pode ser o momento em que elas mais apareçam. Ter uma experiência bela é algo que deve estar incorporado, fazer o que ama, e encontrar um mestre que lhe possa lhe ensinar. Encontrar o seu lugar é quando você se torna profissional.”
*Uma palavra muito utilizada durante a palestra foi “centros sutis”. As partes sutis de nosso corpo que devem ser ativadas no palco para atenção e energia e são também, as partes que ressoam com o canto.
*Espelhamento consciente: primeiro ocorre entre o mestre e o aprendiz, e depois aos outros. É quando a vida interior do mestre ressoa em mim, não porque eu quero, mas porque encontramos uma comunicação sutil.
*Alguém perguntou a Thomas, como o espectador percebe a diferença das ações no ator, a transformação. E ele respondeu: “A energia não se transforma, mas algo se eleva da energia, como uma onda dentro de mim que flui, uma sensação de transformação, abertura da percepção. A transcendência é literal, e é então quando o espectador vê a energia, percebe a transformação (sendo que transformação não é a palavra ideal aqui, é como se fosse uma escada com seus degraus ).”

domingo, 17 de abril de 2011

Palestra Thomas Richards

Copiando o que o ECUM colocou no facebook:

No encontro, Thomas Richards compartilhou: Grotowski me disse: ‘Não escute sua voz, escute o som do espaço’... O corpo é como um violoncelo: o som é feito pela corda, mas não somente pela corda. Até mesmo os lugares mais sutis dentro de nós não são tudo que há. Até mesmo acima de si há outras séries de lugares que se pode alcançar.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Reflexão do dia


"O ser humano vive de razão e sobrevive de sonhos."

François de La Rochefoucauld

(Retirado da folhinha do Sagrado Coração de Jesus)

terça-feira, 5 de abril de 2011

Espetáculo


"[...]

Se a literatura dramática fica documentada em livro e os cenários e figurinos subsistem em fotografias e desenhos, o espetáculo é uma arte efêmera, que se realiza integralmente na sua duração. O preconceito da eternidade da arte, tão difundido, relega por isso o espetáculo a plano inferior, valorizando sua contrapartida o texto, perenizado na história literária. Mas a situação especial do teatro já leva Aristóteles (384-322 a.C) a considerar a duplicidade de peça e espetáculo. Apenas, o teórico da Poética não considera a primeira elemento do segundo, mas o espetáculo parte da tragédia. Para ele, como a tragédia é imitação de ações e a imitação se executa por atores, "o espetáculo cênico há de ser necessariamente uma das partes da tragédia, e depois a música e a elocução, pois estes são os meios pelos quais os atores efetuam a imitação" (ver ARISTÓTELES, Poética, trad. Eudoro de Souza, Lisboa, Guimarães, p.76). A querela reduz-se a problema de terminologia, porque, ao definir a tragédia, o filósofo grego conceitua insensivelmente o teatro ou o espetáculo trágico. Fosse o espetáculo parte da tragédia e não ela elemento dele, não se justificaria que a mesma tragédia resultasse, de acordo com as encenações, em espetáculos tão diferentes.

O efêmero confere ao espetáculo categoria estética especial, que pode ser uma razão a mais para o seu fascínio. Imaginar que, em poucas horas, se frusta uma comunicação artística ou se cumpre o destino do teatro, cria para esse tempo um privilégio.

A repetição ao longo da vida está na base dos prazeres essenciais. Termina um espetáculo, e o sortilégio só ocorrerá, para o seu criador, em novo espetáculo. A concentração de esforços artísticos, em torno do efêmero, atribui ao teatro miséria e grandeza inconfundíveis"


Magaldi, SÁBATO. Iniciação ao teatro. 7ª edição, Editora Ática. São Paulo-SP. Página 13.

Soma de elementos?


"Aceitando-se que o teatro tome de empréstimo a outras artes os elementos que o compõem, a fim de proceder à síntese, cabe perguntar se ele não se caracteriza pela simples soma das conquistas realizadas fora de seu âmbito. A resposta afirmativa situaria o teatro como arte secundária, dependente das experiências levadas a cabo em outros campos.

Num primeiro exame, parece razoável que a literatura faça as suas pesquisas na poesia ou no romance, comunicando os resultados estéticos ao dramaturgo. O arquiteto e o pintor trabalhariam no seu terreno específico, para oferecer ao cenógrafo as soluções a que chegaram. Arranjo a posteriori das parcelas fornecidas por outras artes, o teatro se consideraria mera vulgarização delas, permanecendo em atraso e nunca almejando uma arrancada vanguardista.

É certo que as artes puras se prestam com maior facilidade à experimentação. Arte coletiva, o teatro tende a evoluir com mais cautela, e não se deve esquecer que fala a numeroso público, evidentemente alheio aos requintes do apreciador individual. As implicações coletivas da arte dramática fazem-na mais tímida que a poesia ou as artes plásticas. Ela não se limita, contudo, a aproveitar as formas que lhe são transmitidas nos vários setores.

Por isso se afirma que o teatro é uma síntese de elementos artísticos e não de atores. O cenário utiliza de arquitetura e da pintura alguns dados, mas não se contém numa ou noutra arte: forja a sua própria especificidade, e dentro dela se movimenta livremente, chegando a soluções inéditas. Nada impede que a cenografia seja mais avançada que as outras artes plásticas.

[...]"

Magaldi, SÁBATO. Iniciação ao teatro. 7ª edição, Editora Ática. São Paulo- SP. Página 12.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

A vida da boa peça.


" A grande vida da boa peça só começa quando baixa o pano. É o momento de fazer nossa meditação sobre o amor e sobre a morte."
Nelson Rodrigues

Nelson Rodrigues. "O reacionário Mémorias e confissões" Seleção de Ruy Castro. Pg 286

O fenômeno teatral


"Se nós, atores, conseguirmos realizar e recriar a cada noite, esse momento mágico teatral, com nossa verdade e nossa vida, nossa honestidade e nossa organicidade, impulsionados por nosso além querer, telúrico e divino, então teremos, ainda, muitas teses, dissertações e livros como este, que termina tentando explicar, conceituar e discutir esse fenômeno, que é, em si, inexplicável, imencurável e, principalmente, belo."

Ferracini, Renato. A arte de não interpretar como poesia corpórea do ator/ Renato Ferracini. Campinas, SP. Editora da Unicamp, 2003. Página 249.

Como atriz, tenho de executar.


"Como os europeus têm códigos muito rígidos de interpretação, a pergunta que mais me faziam em Berlim era como eu conseguia representar sem mostrar que estava representando. E a minha resposta sempre foi a mais honesta: não sei, não entendi disso. É muito difícil dissertar sobre o método de trabalho, já que como atriz não tenho função crítica, tenho de executar. Quando perguntam, você faz a reflexão. Mas quando está em cena, tem de fazer."

Fernanda Montenegro em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo 01/04/98 Caderno 2, D1 na repostagem "Fernanda ensina simplicidade em Central do Brasil".

Retirado de: A arte de não interpretar como poesia corpórea do ator/ Renato Ferracini. Campinas, SP. Editora da Unicamp, 2003. Página 249.

O ato primitivo


"Pensamos, nesse breve estudo, por grandes pensadores, muitas teorias, princípios e conceitos complexos. Mas tudo cai por terra quando um ator está vivo em cena. Quando, de alguma forma, Apolo e Dionísio dão-se as mãos, entrelaçando o ator em seu fazer teatral. Nesse momento, todas as teorias esvaziam-se ou parecem tão ínfimas e pequenas ante aquele ato que nos sentimos envergonhados por engendrá-las, pois no teatro, nesse momento vivo do ator, estamos presenciando o ato primitivo e primeiro da verdadeira criação humana. No teatro, no momento vivo do ator em cena, estamos presenciando, além do produto, o próprio ato da criação do ator, acontecendo ante nossos olhos; e a visão desse ato é tão sublime que nos revoluciona, pois a criação é, em si, revolucionária."

Ferracini, Renato. A arte de não interpretar como poesia corpórea do ator/ Renato Ferracini. Campinas, SP. Editora da Unicamp, 2003. Página 248.

Barba sobre o teatro.


" O teatro não é uma ciência exata, um território onde se podem alcançar certos resultados objetivos, transmiti-los e desenvolvê-los. Os resultados e as soluções são encontrados pelos atores e morrem com eles. Porém, os espectadores percebem como sinais objetivos as ações articuladas do ator, que por outro lado, são o resultado de um trabalho subjetivo. Como pode fazer o ator para ser a matriz dessas ações, e, ao mesmo tempo estruturá-las em sinais objetivos cuja origem se encontra em sua subjetividade? Esta é a verdadeira essência da expressão do ator e de sua metodologia. É impossível descobrir a fórmula, o material, os instrumentos que poderiam dar uma resposta definitiva a essa pergunta (Barba, 1991, p.32).

Ferracini, Renato. A arte de não interpretar como poesia corpórea do ator/ Renato Ferracini. Campinas, SP. Editora da Unicamp, 2003. Página 248.

O ator e sua flor


"Finalmente, o ator terá a possibilidade de doar sua flor ao público. Ele cultivou a semente nos trabalhos pré-espressivos, regando-a com os diversos trabalhos e treinamentos. Viu essa semente transformar-se em botão, na forma de matrizes, nas pontes, tratando esse botão com a codificação, vida e organicidade, presenciando, finalmente, o desabrochar de suas flores. Depois colheu todas elas, pelo menos as mais belas e vistosas naquele momento, arranjou-as em um ramalhete, enlaçando-as com os ligâmens. Utilizando uma ferramenta chamada variação de fisicidade, cortou alguns espinhos de uma, aparou algumas folhas de outras, agrupou duas ou três flores em um só talo e tirou o talo de duas outras, deixando somente a flor. Finalmente, embrulhou em papel de espetáculo, entrou em cena e entregou seu ramalhete a todos os presentes através dos olhos e de vibrações desconhecidas mas perceptíveis. Saiu de cena vazio de suas flores, mas preenchido pela troca com o público, e voltou ao jardim para preparar outro ramalhete para a noite seguinte."

Ferracini, Renato. A arte de não interpretar como poesia corpórea do ator/ Renato Ferracini. Campinas, SP. Editora da Unicamp, 2003. Página 244.