quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Dois tipos de atores

"Quando encontrei essa jovem, comecei a ver que existem diferentes tipos de atores. Há um tipo de ator como ela, que está mais centrado na mente, como se habitasse fortemente sua mente lógica. Na maioria das vezes, esse tipo de ator irá trabalhar bem com as ações físicas quando seu primeiro passo consiste em construir a proposta. Ele aborda atuação a partir da mente lógica, primeiro se perguntando o que fez, ou faria, nas circunstâncias dadas. Normalmente constrói uma partitura e memoriza a sequência lógica das ações antes mesmo de fazer qualquer ação física. O perigo para este tipo de ator é que às vezes a sua arte, apesar de ser lógica, permanece fria e nunca toca o coração; ainda que não haja dúvida de que existem atores desse tipo que alcançam um nível muito alto em sua arte.
Outro tipo de ator é aquele que não tem sua linha de ações físicas indicada, primeiro, pela mente. Quando a linha das ações físicas se constitui, ela é, mais do que qualquer outra coisa, uma série de minúsculos impulsos orgânicos que vêm do interior do corpo. O corpo irá ditar a sequência de ações como algo profundamente natural. Esse tipo de ator é mais centrado na organicidade. E se a mente dessa pessoa aprende a ser passiva da maneira certa, então o fluxo dos seus impulsos corporais a levará para um processo profundo. Com esse tipo de ator, a estrutura deve ser modelada depois. Só após o nascimento de sua linha de ações é que sua mente irá compreender o que sua memória era na realidade. Nesse caso, primeiro o corpo se lembra, e depois a mente diz "Ah, era isso que eu estava fazendo naquele momento"; mas antes o corpo se lembrou. Em seguida, essa corrente de impulsos deve estar ligada à corrente de associações que já foi capturada. O perigo para esse tipo de ator é continuar sendo um diletante, e apesar de seu trabalho ser quente e espontâneo no momento da improvisação, ele nunca irá dominar a habilidade para trabalhar dentro de uma estrutura precisa e para repetir uma sequência de ações com total exatidão." Thomas Richards, Trabalhar com Grotowski sobre as ações físicas; tradução do inglês Patrícia Furtado de Mendonça. pg. 91 e 92.

segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Diletantismo e ator turista

"... Só mais tarde é que eu seria capaz de enxergar a verdade que se escondia atrás de sua gozação: o perigo que ele intuiu é que eu poderia me tornar um diletante, alguém que flutua entre uma coisa e outra sem se confrontar com a necessidade de um ofício, alguém que encara a vida sem responsabilidade. Mas depois não pensei mais na brincadeira do meu pai. Achei que ele estivesse simplesmente imerso nas superficialidades da vida normal, então segui meu caminho sem me preocupar mais com isso. Eu não esperava que diletantismo e comportamento "turístico" seriam exatamente as características com as quais o próprio Grotowski me atacaria de forma severa durante o trabalho de Botinaccio daquele verão." Thomas Richards, Trabalhar com Grotowski sobre as ações físicas; tradução do inglês Patrícia Furtado de Mendonça. pg. 35.

Compreender algo com a mente é muito diferente de ser capaz de fazer algo.

"Durante essa palestra no Hunter College, ouvi pela primeira vez uma explicação teórica sobre o "método das ações físicas" de Stanislávski. Naquela época eu pensei: "Entendi. Como método parece bastante simples, é lógico. Está bem, essa coisa é fácil demais; agora, como ter acesso à revelação interior?" Mas naquele verão, na Itália, eu começaria a aprender que ter a compreensão de algo apenas com a mente é muito diferente do que ser capaz de fazer algo. Saber algo é outra coisa, está mais relacionado à capacidade que uma pessoa tem de fazer, de pôr em prática. Depois dessa palestra, ingenuamente, achei que minha compreensão mental do "método das ações físicas" fosse suficiente." Thomas Richards, Trabalhar com Grotowski sobre as ações físicas; tradução do inglês Patrícia Furtado de Mendonça. pg. 34.

Ética para um trabalho conciso

"...Se fosse me tornar um ator, era claro que eu precisaria trabalhar com alguém que me ensinasse como fixar o processo vivo, para que pudesse ser repetido; alguém cuja ética artística não tivesse sido corrompida pela demanda do "business", que precisa de um produto imediatamente vendável. Só no trabalho com Grotowski eu senti esse tipo de integridade. Então resolvi trabalhar com ele, a qualquer custo." Thomas Richards, Trabalhar com Grotowski sobre as ações físicas; tradução do inglês Patrícia Furtado de Mendonça. pg. 29.

Thomas Richards e sua experiência atuando em Nova York

"...Nessas produções, como os períodos de ensaio eram curtos - de três a quatro semanas - os problemas eram outros. Os atores não trabalhavam para a peça em que estavam atuando, mas para a próxima peça: o valor do trabalho presente reside apenas em sua função de trampolim..." Thomas Richards. Trabalhar com Grotowski sobre as ações físicas; tradução do inglês Patrícia Furtado de Mendonça. pg. 27

quarta-feira, 8 de maio de 2013

Equivalência

"Colocamos flores em um vaso para que mostrem sua beleza, para que alegrem a visão e o olfato. Podemos transformá-las em uma mensagem: piedade filial ou religiosa, amor, reconhecimento, respeito. Porém, por mais belas que sejam, possuem um defeito: arrancadas de seu contexto representam somente a si mesmas. São como o ator do qual fala Decroux: um homem condenado a parecer um homem, um corpo que imita um corpo. Pode ser prazeroso, mas é insuficiente para a arte. Para que seja arte, acrescenta Decroux, é preciso que a ideia da coisa seja representada por uma outra coisa. As flores em um vaso, em vez disso, são irremediavelmente flores em um vaso, algumas vezes, sujeitos de obras de arte, mas jamais obras de arte em si. Imaginemos usar as flores cortadas para representar a luta da planta para crescer, para distanciar-se da terra na qual quanto mais se afundam suas raízes mais seu talo se eleva em direção ao céu. Imaginemos querer representar a passagem do tempo como a planta nasce, cresce, murcha e morre. Se alcançamos nossos propósito, as flores representarão algo diferente das flores e vão compor uma obra de arte. Haveríamos feito um ikebana." A canoa de papel, Eugênio Barba, 2012, pg. 48.