sexta-feira, 25 de julho de 2008

Hoje mesmo


Hoje Mesmo
Nando Reis
Composição: Nando Reis

O jeito que você arruma seu cabelo procurando aquele efeito que o mundo não quer reparar
- Revela tanto!
E o tempo que demora para decidir se aquilo que está ouvindo é convincente para poder concordar
- E me deixa esperando.
Eu posso esperar

Assim que eu entro já no cumprimento eu reconheço as múltiplas perguntas que na ausência entram em meu lugar
Seus olhos fitam com medo.
A única certeza que eu tenho é absurda pois a dúvida sustento porque não me mudar
Pro seu apartamento
Hoje mesmo

Hoje eu vou sair por aí anunciando que o Sol não vai mais se deitar
As plantas gostam de chuva mas por você nem mesmo as nuvens teriam razão de haver em nenhum lugar
NãoÂ…
NãoÂ…

Se um gênio perguntasse quais seriam os meus três desejos o primeiro: pediria ao tempo voltar pra trás:
- pra te ver aos dezesseis anos
Não há idéia que alcance ou seja parecida com a imagem da menina esguia, a bolsa a tiracolo
- e as pedras só pesando
Pois ela nunca irá jogá-las!

O seguinte, segundo desejo, emoldurar no céu o seu sorriso que eupensei que nunca mais pudesse reencontrar
O filho é que cria a mãe

E o último, complexo, honesto e genuíno, amar sem precisar da dor, querer também sem magoar
Tocar seu corpo
Hoje mesmo.

A arte de ator



Recebi este texto da professora Silvana Stein(Grupo Galpão Cine Horto-BH) da oficina de voz-o corpo e a palavra no teatro-Estudo da voz para o teatro,no ano passado.Retirado da Revista do Lume:

A Arte de Ator

Luis Otávio Burnier Lume

Yan,alma para os índios.Estaria ela perdida,esquecida, ou em simples e imperceptível transformação?Uma transformação que por não ser muito percebida,vem a ser perigosa. Como lutar contra o que sequer percebemos,contra o que não se sabe? Será possível ter consciência daquilo que não se percebe?
A arte trabalha antes de mais nada com a percepção.Seu poder principal não está em o quê quer dizer,mas no como. Quando atinge sua percepção,é que ela revoluciona. E no inconsciente que encontramos nossa particularidade, nossa indibidualidade, mas também os elos que nos atam uns aos outros.É a arte quando logra atingir nosso inconsciente, nossa percepção profunda, vasculha um universo equiparável ao dos sonhos, dos pesadelos, como desejou Artaud.
Mas para atingir este universo interior, subjetivo, perceptivo, a arte precisa fazer uso de instrumentos materiais objetivos. Com freqüencia se diz que o instrumento de trabalho do ator é o seu corpo. Não podemos transformar um defunto em ator. O corpo não é algo, e nossa pesoa algo distinto. O corpo é a pessoa. A alma o anima,mas sem ele não seríamos pessoas, mas anjos. Tampouco é o corpo vivo o instrumento de trabalho do ator. A arte é algo que está em vida, ou seja, algo que irradia uma vibração, uma presença. É o corpo-em-vida,como prefere Eugênio Barba, o instrumento do ator. Existem no entanto .Como nota o próprio Barba, pelo menos duas dimensões deste corpo-em-vida: a dimensão física e mecânica e a dimensão interior. As duas formam uma unidade. Esta unidade, no âmbito do trabalho do ator nem sempre é ou pode ser trabalhada como tal. Ela deve ser vista não como um ponto de partida:mas como ponto de chegada. Pode-se, e é às vezes necessário, trabalhar estas dimensões separadamente.
No entanto,não se pode perder de vista a unidade. Trabalhar tão somente a dimensão física e mecânica seria formar jovens belos e fortes, mas não necessariamente atores: trabalhar apenas a dimensão interior poderia ser terapêutico, mas tampouco formaria atores. Uma não existe sem a outra, mesmo que o enfoque possa estar momentaneamente centrado em uma ou outra destas duas dimensões. A imagem usada por Artaud é novamente bem vinda: atletas afetivos.
Se o corpo não é tão somente corpo, mas corpo-em-vida, então ele é o canal por meio do qual o ator entra em contato com aspectos distintos de ser ser gravado em sua memória. O corpo não tem memória, ele é memória, como disse Grotowski. Trabalhar um ator é, sobretudo e antes de mais nada, preparar seu corpo não para que ele diga, mas para que ele permita dizer. Não mostrar o que ele é, mas revelar o que, por meio dele , se descobre ser. Ser artista é antes de mais nada se predispor a revelar . A revelação pede generosidade e coragem. Uma máscara pode mesquinha e covardemente esconder ou revelar, dilatando o que não se vê. Depende de como ela é usada. Um corpo também. Podemos nos esconder atrás de nosso corpo, de maneira a deixá-lo belo, e isto não ser senão uma forma de escamotear o que temos medo de ser ou demonstrar. Ou, ao contrário, por meio do corpo podemos revelar o que somos e sentimos. O artista descobre por meio de sua arte o sentido de suas coisas. Ele não diz o sentido,nos permite descobrir um sentido. E paradoxalmente, este sentido não está em outro lugar se não em nós mesmos. O artista e sua arte abrem, portanto, caminhos que nos permitem entrar em contato com nossa própria percepção profunda, com algo que existe em nós e está adormecido, esquecido.A arte não é senão uma viagem para dentro de nós mesmos, um reatar contato com recantos secretos, esquecidos, com a memória.
A busca do ator, assim como a de todo artista que quer algo mais do que um simples reconhecimento social e econômico, é a incontestável tentativa de reavivar a memória.A verdadeira técnica da arte do ator é aquela que consegue esculpir o corpo e as ações físicas no tempo e no espaço:acordando memórias, dinamizando energias potenciais humanas, tanto para o ator como para o espectador.

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Da realidade


DA REALIDADE

O sumo bem só no ideal perdura...
Ah! quanta vez a vida nos revela
Que "a saudade da amada criatura"
É bem melhor do que a presença dela...

Mário Quintana

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Uma alegria para sempre


As coisas que não conseguem ser olvidadas
continuam acontecendo.
Sentimo-las como da primeira vez,
sentimo-las fora do tempo,
nesse mundo do sempre
onde as datas não datam.
Só no mundo do nunca existem lápides...
Que importa se - depois de tudo - tenha "ela" partido
ou que quer que te haja feito, em suma?
Tiveste uma parte da sua vida que foi só tua e, esta,
ela jamais a poderá passar de ti para ninguém.
Há bens inalienáveis, há certos momentos que,
ao contrário do que pensas,
fazem parte de tua vida presente
e não do teu passado.
E abrem-se no teu sorriso mesmo quando,
deslembrado deles,
estiveres sorrindo a outras coisas.
Ah, nem queiras saber o quanto deves à ingrata
criatura...
A thing of beauty is a joy for ever
-disse, há cento e muitos anos,
um poeta inglês que não conseguiu morrer.

Quem ama inventa


Quem ama inventa as coisas a que ama...
Talvez chegaste quando eu te sonhava.
Então de súbito acendeu-se a chama!
Era a brasa dormida que acordava...
E era um revôo sobre a ruinaria,
No ar atônito bimbalhavam sinos,
Tangidos por uns anjos peregrinos
Cujo dom é fazer ressurreições...
Um ritmo divino? Oh! Simplesmente
O palpitar de nossos corações
Batendo juntos e festivamente,
Ou sozinhos, num ritmo tristonho...
Ó! meu pobre, meu grande amor distante,
Nem sabes tu o bem que faz à gente
Haver sonhado... e ter vivido o sonho!

Amar:


Amar: Fechei os olhos para não te ver
e a minha boca para não dizer...
E dos meus olhos fechados desceram lágrimas que não enxuguei,
e da minha boca fechada nasceram sussurros
e palavras mudas que te dediquei...

O amor é quando a gente mora um no outro.

Diálogo bobo


- Abandonou-te?
- Pior ainda: esqueceu-me...

[Mario Quintana; Da preguiça como método de trabalho, 1987]

O eterno espanto


Que haverá com a lua que sempre que a gente a olha é com o súbito espanto da primeira vez?

[Mario Quintana; Da preguiça como método de trabalho, 1987]

Indivisíveis


O meu primeiro amor e eu sentávamos numa pedra
Que havia num terreno baldio entre as nossas casas.
Falávamos de coisas bobas,
Isto é, que a gente achava bobas
Como qualquer troca de confidências entre crianças de cinco anos.
Crianças...
Parecia que entre um e outro nem havia ainda separação de sexos
A não ser o azul imenso dos olhos dela,
Olhos que eu não encontrava em ninguém mais,
Nem no cachorro e no gato da casa,
Que tinham apenas a mesma fidelidade sem compromisso
E a mesma animal - ou celestial - inocência,
Porque o azul dos olhos dela tornava mais azul o céu:
Não, não importava as coisas bobas que diséssemos.
Éramos um desejo de estar perto, tão perto
Que não havia ali apenas duas encantadas criaturas
Mas um único amor sentado sobre uma tosca pedra,
Enquanto a gente grande passava, caçoava, ria-se, não sabia
Que eles levariam procurando uma coisa assim por toda a sua vida...

Poeminho do contra


Poeminho do contra

Todos esses que aí estão
Atravancando meu caminho,
Eles passarão...
Eu passarinho!


[Mario Quintana, Prosa e Verso, 1978]

Canção para uma valsa nova


Canção para uma valsa nova


Minha vida não foi um romance...
Nunca tive até hoje um segredo.
Se me amas, não digas, que morro
De surpresa... de encanto... de medo...

Minha vida não foi um romance...
Minha vida passou por passar.
Se não amas, não finjas, que vivo
Esperando um amor para amar.

Minha vida não foi um romance...
Pobre vida... passou sem enredo...
Glória a ti que me enches a vida
De surpresa, de encanto, de medo!

Minha vida não foi um romance...
Ai de mim... Já se ia acabar!
Pobre vida que toda depende
De um sorriso... de um gesto... um olhar...


Mário Quintana

Amar é...


Carreto

Amar é mudar a alma de casa.

Mário Quintana

Canção de vidro


Canção de vidro


E nada vibrou...
Não se ouviu nada...
Nada...

Mas o cristal nunca mais deu o mesmo som.

Cala, amigo...
Cuidado, amiga...
Uma palavra só
Pode tudo perder para sempre...

E é tão puro o silêncio agora!

Mário Quintana

Que meigo!


DA FALSIDADE

Foi tudo falso, o que ela disse?
Fecha os olhos e crê: a mentira é tão linda!
Nem ela sabe que fingir meiguice
É o mais certo sinal de que te ama ainda...

Mário Quintana

Mário Quintana


A oferenda

Eu queria trazer-te uns versos muito lindos...
Trago-te estas mãos vazias
Que vão tomando a forma do teu seio.

domingo, 20 de julho de 2008

Passado sem culpa


Por Mário Quintana

Eu queria sair por aquela porta e conhecer alguém. Assim, sem precisar procurar no meio da multidão.
Alguém comum, sem destaques evidentes, sem cavalos brancos ou dentes perfeitos.
Alguém que soubesse se aproximar sem ser invasivo ou que não se esforçasse tanto para parecer interessante.
Alguém com quem eu pudesse conversar sobre filosofia, literatura, música, política ou simplesmente sobre o meu dia.
Alguém a quem eu não precisasse impressionar com discursos inteligentes ou com demonstrações de segurança e autoconfiança.
Alguém que me enxergasse sem idealizações e que me achasse atraente ao acordar, de camisa amassada e sem maquiagem.
Alguém que me levasse ao cinema e, depois de um filme sem graça, me roubasse boas gargalhadas.
Alguém de quem eu não quisesse fugir quando a intimidade derrubasse nossas máscaras. Eu queria não precisar usá-las e ainda assim não perder o mistério ou o encanto dos primeiros dias. Alguém que segurasse minha mão e tocasse meu coração. Que não me prendesse, não me limitasse, não me mudasse.
Alguém com quem eu pudesse aprender e ensinar sem vergonhas ou prepotências.
Alguém que me roubasse um beijo no meio de uma briga e me tirasse a razão sem que isso me ameaçasse. Que me dissesse como eu canto e que eu falo demais e que risse das vezes em que eu fosse desastrada.
Alguém que me olhasse nos olhos quando fala, sem me deixar intimidada. Que não depositasse em mim a responsabilidade exclusiva de fazê-lo feliz para com isso tentar isentar-se de culpa quando fracassasse.
Alguém de quem eu não precisasse, mas com quem eu quisesse estar sem motivo certo.
Alguém com qualidades e defeitos suportáveis. Que não fosse tão bonito e ainda assim eu não conseguisse olhar em outra direção.
Alguém educado, mas sem muitas frescuras. Engraçado e, ao mesmo tempo, levasse a vida a sério, mas não excessivamente.
Alguém que me encontrasse até quando eu tento desesperadamente me esconder do mundo. Eu queria sair por aquela porta e conhecer alguém imperfeito. “Feito para mim.”

PS:retirei de um blgo alheio!rsrs^^